PAIXÃO DE CRISTO
A paixão de Jesus foi marcada pela crueldade própria do suplício que era reservado aos condenados à morte. Podemos recuperar alguns detalhes deste sofrimento, transcrevendo as informações de livros que merecem ser lidos a este respeito: René Laurentin, Vida autêntica de Jesus Cristo, Tomo 1, Paulinas 2002. Pierre Barbet: A Paixão de Cristo segundo o cirurgião, Ed. Loyola,1980. Vittorio Messori, Padeceu sob Pôncio Pilatos?, Ed. Santuário, 1993 A FLAGELAÇÃO
Usava-se o "flagrum", instrumento especificamente romano. Compunha-se de um cabo curto ao qual estavam fixados grossos e compridos látegos, geralmente dois. A pequena distância de sua extremidade livre, estavam inseridas pequenas esferas de chumbo ou ossos de carneiro... Os látegos cortavam mais ou menos a pele, e as bolas ou os ossinhos nela imprimiam profundas contusões. De onde se seguia uma hemorragia nada desprezível e um enfraquecimento considerável da resistência vital. [...] O número de golpes com o açoite era, segundo o direito judeu, rigorosamente limitado a 40. Mas os fariseus, gente escrupulosa, para ter absoluta certeza de não ultrapassar o número, exigiam que se contasse "40 menos 1", isto é, 39. Entre os romanos, a lei não conhecia outro limite senão a necessidade de não matar o condenado sob os golpes; era ainda necessário que ficasse com forças suficientes para carregar seu patíbulo, e que morresse sobre a cruz, regularmente. Era ele, às vezes, como diz Horácio, "sectum flageIlis. . . praeconis ad fastidium - dilacerado pelos açoites. .. até enfastiar o carrasco" (Ep IV). (Barbet p. 58-59)
O CAMINHO DO CALVÁRIO “De acordo com a norma, o condenado devia levar até o lugar do suplício a pesada viga transversal, sobre a qual seria pregado ou amarrado, conforme o caso. Os soldados colocam esse patibulum, portanto, sobre os ombros ensangüentados de Jesus. É apenas o começo das piores dores. O carpinteiro de Nazaré carregou vigas semelhantes àquela, mas não sobre chagas vivas. Ele avança, então, esgotado pela noite passada em claro, pelos maus tratos e pela flagelação. [...] Por enquanto o pior não são os açoites e os soldados, que o instigam [...]: é a viga que se incrusta dolorosamente em toda a largura de seus ombros rasgados por mais de cem golpes de chicote.O sudário traz sua marca horizontal: a impressão da madeira sobre os ombros do portador.” (Laurentin p. 469) “Portanto, o condenado prévia e devidamente flagelado, fazia a pé, sem roupas e carregando seu patíbulo, o trajeto do tribunal ao local do suplício, onde o estava esperando seu "stipes" (a haste vertical da cruz), no meio de verdadeira floresta de outras semelhantes. [...] “O patíbulo [a haste horizontal] era colocado sobre as espáduas e braços estendidos transversalmente, e em seguida amarrado nas mãos, braços e peito. Era, portanto, só o patíbulo que o condenado carregava. [...] O patíbulo sozinho devia pesar cerca de 50 quilos e a cruz inteira devia ultrapassar os cem quilos. Note-se que o carregar o patíbulo já não deixava de ser bem rude prova para um homem que acabava de sofrer severa flagelação e, por conseguinte, perdera boa parte de seu sangue e de suas forças. [...] (Barbet p. 59-60) A COMPAIXÃO DAS MULHERES
VINHO COM MIRRA “Como é afirmado no antigo Tratado judaico sobre o Sinédrio: “Quando um homem deve ser justiçado, permite-se que tome um grão de incenso em um cálice de vinho para perder a consciência (...) As mulheres nobres de Jerusalém disso se encarregam.” [...] Se para Marcos o vinho está misturado com mirra, segundo Mateus “deram-lhe para beber vinho misturado com fel” (27,34). Será interessante examinar um pouco essa variante. Mateus baseia-se na tradição proveniente das testemunhas, que recordavam perfeitamente como também a Jesus, segundo o costume constante, tinha sido oferecida a bebida dos condenados à morte. Mas, diversamente de Marcos, que dá a receita exata (incenso, mirra e talvez outras substâncias anestésicas), ele introduz uma variante: o fel. É provável que o primeiro evangelista tenha sido influenciado pelo salmo 69, que a tradição cristã (mas não a hebraica) aplicava a Jesus: “Puseram-me veneno na comida, em minha sede deram-me a beber vinagre” (v.22). (Messori, 256) O VINAGRE Os evangelistas todos falam de vinagre oferecido a Jesus: “Nos regulamentos militares [dos romanos] constava que cada destacamento, fora dos castra ou dos oppida da guarnição, devia levar consigo uma bebida num grande recipiente à disposição de todos [...] Essa bebida “regulamentar” era a posca, uma mistura de água e de vinagre – barata e boa para matar a sede – inseparável dos soldados engajados sob os estandartes de Roma ... (Messori, 257-258) A CRUCIFIXÃO
Chegados ao Calvário, oferecem-lhe vinho misturado com mirra (Mc. 15,23): “Tem início, então, a mais sinistra tarefa. Com um ufa! de alívio, Simão deitou por terra a pesada trave. Desvencilha-se desse trabalho sujo e da vergonha. Ele ignora que esta corvéia é um gesto histórico e passa seu nome à posteridade ao longo de milhares de anos. Os soldados trazem pregos e martelos. Alinham as três vigas ao pé dos três troncos erguidos: colocando Jesus ao meio, eles mantêm prontos os três condenados. Entregam-se inteiramente ao trabalho, como um todo, cada um à sua tarefa do momento. Para eles, o corpo e a madeira não passam de objetos: a madeira é mais dócil, os corpos, mais rebeldes, com suas reações às vezes imprevisíveis. Não fazem diferença entre os três condenados; isso significa apenas trabalhar três vezes mais: uma cruenta e suja tarefa que ensurdecem os gritos horríveis da gentalha [...]" (Laurentin p.474)
“O patibulum, que havia dilacerado as
costas feridas pelos açoites, jaz aí, por terra. Eles encostam Jesus nele,
brutalmente deitado sobre a madeira. Um dos soldados encosta a ponta do enorme
prego sobre um dos punhos, procurando a cavidade que ele bem conhece, no centro
dos ossinhos. Aí o prego entra como em manteiga, ele sabe. Ele, porém, não sabe
que isso se chama o espaço de Destot: no meio dos pequenos ossos do metacarpo.
Ele ignora, sobretudo, exceto pelas crispações e urros de morte dos condenados,
que ele assim provoca a mais terrível dor imaginável “Maquinalmente, o soldado-carpinteiro, triste concorrente de Jesus em sua oficina, prepara esse ato de precisão. Um ou dois soldados seguram a mão de Jesus. Outro ajusta o prego, apóia-lhe firmemente a ponta no lugar onde penetra, no início do pulso. O martelo se ergue... Horror! Agora, o outro braço: a mesma tortura redobrada. É uma loucura.. . Oh, esses nervos medianos! Repetia o doutor Barbet, que estudou essa dor e não conseguia recompor-se. (P. Barbet - La Passion de Jésus-Christ selon le chirurgien - Issoudun, 1950)". “Tal é, portanto, a abominação de nossos pecados quando atinge Deus nosso Salvador. Seria necessário um amor mais forte do que todo sofrimento para inverter essa dor infernal. O duplo fogo interior sobe à cabeça de Jesus, de cada punho de onde parte a dor, quase a ponto de fazê-lo perder os sentidos. [...] Vários soldados agarram agora as duas extremidades da viga sobre a qual Jesus acaba de ser pregado como um pássaro de mau agouro; seu corpo está agitado, estirado em todos os sentidos. Para eles, é o momento delicado. Eles erguem a viga, à força do braço (ou por um sistema de polia), fixam-na sobre a estaca (stipes) a uns dois metros do chão (A. Legrand, Le Linceul, 1980, p. 138). "O corpo que eles manipulam nada mais é que uma chaga. Está sacudido e agitado pelos arrastamentos em todas as direções nessas transferências descuidadas. De que adiantaria ter cuidado? As pernas pendem lamentavelmente, a 40 centímetros do chão. Ele está "elevado da terra", como predissera. Como pudera dizer que tal elevação humilhante iria "atrair tudo a ele"? (Jo. 12,32; cf. 3,14 e 8,28). Seu corpo está exposto à vergonha, a céu aberto. A glória de seu Amor infinito não poderia estar mais velada aos olhares deste mundo. Os soldados ajeitam os pés, sobrepondo-os. Eles os fixam, talvez com um único prego que os atravessa. Tal foi o caso do jovem crucificado Jehohanan (26 anos), recentemente encontrado nas escavações de Gi'a ha Mivtar: o prego media 7,5 centímetros (Legrand, p. 166)” (Laurentin p. 475) MORTE DE CRUZ
O crucificado acabava morrendo por
asfixia. O peso do corpo, pendente dos braços esticados para cima, provocava
cãibras terríveis que se espalhavam por todo o corpo. Cãibras que afetam os
músculos que permitem a inspiração: os pulmões enchem-se de
ar, mas não
conseguem expirar. Com isso a oxigenação do sangue começa a entrar em colapso. O
condenado podia recuperar a
Fl. Castro cssr |